domingo, 14 de outubro de 2012

A caminho de Marte (parte 1)



Esta é a primeira parte de um extenso texto sobre a história e o estado atual do interesse do Homem por Marte, publicado no suplemento Q. do DN de 22 de setembro de 2012 com o título 'A conquista de Marte vive dividida entre a ciência e o sonho'.

A 19 de maio de 1845, sob o comando de John Franklin (1), dois navios – o Erebus e o Terror – largavam de Greenhithe, no sudeste inglês. O destino? Descobrir a passagem do noroeste, ou seja, uma rota marítima que ligasse o Atlântico ao Pacífico, partindo da Gronelândia, passando pelos mares a norte do Canadá e chegando finalmente ao Alasca. A 25 de junho um baleeiro, ao largo da Gronelândia, avistou os navios, junto a um icebergue. E depois, desapareceram... Entre 1848 e 1850 cerca de 50 expedições tentaram localizá-los. Encontraram corpos gelados de tripulantes e, entre esquimós que recolheram peças perdidas, identificaram pistas que permitiram descobrir o porquê do fim trágico da expedição. Como chegou a ser descrito pelo historiador Pierre Breton, os dois navios levavam 127 homens e toneladas de material. Entre as bagagens iam loiças da china, pratas, uniformes de gala, botões de punho. Ou, como escreve Robert Zubrin em The Case For Mars, onde recorda esta expedição, “Franklin levou consigo tudo o que precisava, menos o que lhe fazia falta para sobreviver” (2) 

Como recorda este autor, a expedição de Franklin ficou encurralada no gelo, no outono de 1846, e a tripulação viveu então das provisões de carne salgada, sem capacidade para evitar o escorbuto. E assim, um após outro, foram morrendo.

Roald Amudsen
Em 1903, Roald Amundsen (3) partiu de Christiania (a atual Noruega) para tentar concretizar o feito a que a expedição de Frankin se lançara. Mas com uma diferença maior: resolveu pensar uma missão que não dependesse do que levava, mas que pudesse viver do que o ambiente ao seu redor lhe desse. Confiou, explica Zubrin, nas capacidades anti-escorbuto de parte da carne das vísceras de Caribu e na gordura da pele de alguns cetáceos. Aprendeu as técnicas de deslocação dos esquimós, assim como a construir habitações de gelo, e optou por roupas como as que os esquimós usam em vez das lãs europeias... A sua expedição também ficou presa entre o gelo. Mas em 1905 encontrava finalmente um local com um telégrafo para dar a boa notícia.

A memória da missão trágica de Franklin e a da expedição do norueguês servem aqui para uma simples analogia. Porque, tal como Robert Zubrin defende no seu livro A Case For Mars, a estratégia de uma expedição que “viva da terra” será a mais viável para uma eventual expedição tripulada a Marte.

1 – John Franklin (1786-1847) Oficial da marinha britânica e explorador da região árctica. Morreu durante uma missão que procurava a passagem de nordeste.
2 – in The Case For Mars, de Robert Zubrin, Touchstone (1997), pág 17.
3 - Roald Amundsen (1872-1928) Explorador norueguês das regiões polares. Foi o primeiro a atravessar a passagem do nordeste, entre 1903 e 1906, descobriu o Pólo Sul em 1911 e alcançou o Pólo Norte em 1926. Desaparecem em 1928 numa missão de salvamento no mar de Barens.

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